O
apego ao contingente, ao imediato, apaga na consciência dos nossos
dias o senso de responsabilidade espiritual. Nem mesmo a ronda
constante da morte consegue arrancar o homem atual da embriaguez do
presente. O problema do espírito e da imortalidade só se aviva
quando ligado diretamente a questões de interesse pessoal.
O
católico, o protestante, o espírita se equivalem nesse sentido.
Todos buscam os caminhos do espírito para a solução de questões
imediatistas ou para garantirem a si mesmos uma situação melhor
depois da morte. A maioria absoluta dos espiritualistas está sempre
disposta a investir (este é o termo exato) em obras assistenciais,
mas revela o maior desinteresse pelas obras culturais.
Apegam-se
os religiosos de todos os matizes à tábua de salvação da caridade
material, aplicando grandes doações em hospitais, orfanatos e
creches, mas esquecendo-se dos interesses básicos da cultura.
Garantem os juros da caridade no após-morte, mas contraem pesadas
dívidas no tocante à divulgação, sustentação e defesa de
princípios fundamentais da renovação da cultura planetária.
A
imprensa, a literatura, o ensaio, o estudo, a fixação das linhas
mestras da nova cultura terrena ficam ao deus-dará. Falta uma tomada
de consciência, particularmente no meio espírita, da
responsabilidade de todos na construção e na elaboração da Nova
Era, que é trabalho dos homens na Terra.
Ninguém
ou quase ninguém compreende que sem uma estruturação cultural
elevada, sem estudos aprofundados no plano cultural, que revelem as
novas dimensões do mundo e do homem na perspectiva espírita, o
Espiritismo não passará de uma seita religiosa de fundo egoísta,
buscando a salvação pessoal de seus adeptos, precisamente aquilo
que Kardec lutou para evitar.
A
finalidade do Espiritismo, como Kardec acentuou, não é a salvação
individual, mas a transformação total do mundo, num vasto processo
de redenção coletiva. Proporcionar aos jovens uma formação
cultural apoiada numa positiva e completa base espiritual, que mostre
a insensatez das concepções materialistas e pragmatistas,
dando-lhes a firmeza necessária na sustentação e defesa dos
princípios doutrinários, não é só caridade, mas também a
realização efetiva dos objetivos superiores do Espiritismo nesta
fase de transição.
Sem
esse trabalho não poderemos avançar com segurança e eficácia na
direção da Era do Espírito. Temos de dar às novas gerações a
possibilidade de afirmarem, diante do desenvolvimento das Ciências e
do avanço geral da Cultura, como disse Denis Bradley: "Eu não
creio, eu sei!" Porque é pelo saber, e não pela crença, pela
fé racional e não pela fé cega, pelo conhecimento e não pelas
teorias indemonstráveis que o Espiritismo, como revelação
espiritual, terá de modelar a nova realidade terrena, apoiado na
confirmação científica, pela pesquisa, dos seus postulados
fundamentais. A revelação humana confirma e comprova a revelação
divina.
Esse
é o problema que ninguém parece compreender. Todos sonham com o
momento em que a Ciência deverá proclamar a realidade do espírito.
Mas essa proclamação jamais será feita, se a Ciência Espírita
não atingir a maioridade, não se confirmar por si mesma, podendo
enfrentar virilmente, no plano da inteligência e da cultura, a visão
materialista do mundo e a concepção materialista do homem.
Por
isso precisamos de Universidades Espíritas, de Institutos de Cultura
Espírita dotados de recursos para uma produção cultural digna de
respeito, de Laboratórios de Pesquisa Psíquica estruturados com
aparelhagem eficiente e orientados por metodologia segura, planejada
e testada por especialistas de verdade, capazes de dominar o seu
campo de trabalho e de enfrentar com provas irrefutáveis os sofismas
dos negadores sistemáticos. É uma batalha que se trava, o bom
combate de que falava o Apóstolo Paulo, agora desenvolvido com todos
os recursos da tecnologia.
Chega
de pieguice religiosa, de palestras sem fim sobre a fraternidade
impossível no meio de lobos vestidos de ovelhas. Chega de caridade
interesseira, de imprensa condicionada à crença simplória, de
falações emotivas que não passam de formas de chantagem
emocional.
Precisamos
da Religião viril que remodela o homem e o mundo na base da verdade
comprovada. Da caridade real que não se traduz em esmolas, mas na
efetivação da fraternidade humana oriunda do conhecimento de nossa
constituição orgânica e espiritual comuns, ou seja, da inelutável
igualdade humana. De exposições sábias e profundas dos problemas
do espírito, nascidas da reflexão madura e do estudo metódico e
profundo.
Temos
de acordar os dorminhocos da preguiça mental e convocar a todos para
as trincheiras da guerra incruenta da sabedoria contra a ignorância,
da realidade contra a ilusão, da verdade contra a mentira. Sem essa
revolução em nossos processos não chegaremos ao mundo melhor que
já está batendo, impaciente, às nossas portas.
Não
façamos do Espiritismo uma ciência de gigantes em mãos de pigmeus.
Ele nos oferece uma concepção realista do mundo e uma visão viril
do homem. Arquivemos para sempre as pregações de sacristão, os
cursinhos de miniaturas de anjos, à semelhança das miniaturas
japonesas de árvores.
Enfrentemos
os problemas doutrinários na perspectiva exata da liberdade e da
responsabilidade de seres imortais. Reconheçamos a fragilidade
humana, mas não nos esqueçamos da força e do poder do espírito
encerrado no corpo. Não encaremos a vida cobertos de cinzas
medievais. Não façamos da existência um muro de lamentações.
Somos
artesãos, artistas, operários, construtores do mundo e temos de
construí-lo segundo o modelo dos mundos superiores que se destaquem
nas constelações. Estudemos a doutrina aprofundando-lhe os
princípios. Remontemos o nosso pensamento às lições viris do
Cristo, restabelecendo na Terra as dimensões perdidas do seu
Evangelho. Essa é a nossa
tarefa.
J.H.Pires
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formatação
e pesquisa: Milter - 20-04-2014
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