Em 1º de janeiro de 1900 foram lançados os primeiros selos comemorativos do Brasil. Essa emissão fez parte do conjunto de festividades concebidas para o 4º centenário do descobrimento do País. Consistiam em quatro selos e representavam momentos históricos distintos.
O primeiro selo retrata o descobrimento, onde é possível ver uma nau portuguesa em alto mar, a Cruz de Malta no céu e dois índios observando a caravela em terra. O segundo selo é a representação da Independência, com D. Pedro e seus soldados. O terceiro retrata a Abolição, e é possível ver um anjo redentor libertando os escravos de suas correntes. O último selo traz Mariane, representação feminina da República, apontando para uma estrela e para a data de 15 de novembro de 1889.
Os momentos históricos representados nos selos não foram escolhidos por acaso e são reveladores da concepção histórica da época e da tentativa, por parte das autoridades políticas, de construir a identidade nacional.
Nesse período, o País vinha passando por sucessivas crises econômicas e políticas. O Regime Republicano, já com mais de uma década de existência e com inúmeros conflitos, encontrava-se desacreditado por muitos. As comemorações do centenário foram uma forma de resgatar o passado para projetar uma perspectiva de futuro, pautado nas crenças referentes à modernidade. A releitura do passado vinha como uma forma de mostrar ao mundo, e ao próprio Brasil, a existência de um País moderno e civilizado, conforme o pensamento do período.
Tendo em vista esse contexto, a ordem cronológica dos selos parece ter sido pensada de tal maneira que as pessoas pudessem olhar o passado, e, por meio dele, descobrir a modernidade presente. A história, nesse caso, é compreendida em uma escala evolutiva, que se encaminha para a civilização.
O fato de os quatro selos seguirem ordem temporal e culminarem, justamente, no advento da República, traz à tona, também, uma ruptura com o regime anterior, o Império. Escolher celebrar o descobrimento era uma forma de apagar o passado recente, fazendo com que as pessoas se voltassem ano passado distante para resgatar a identidade brasileira.
Assim, os quatro selos têm como objetivo enaltecer o regime republicano, colocando lado-a-lado o passado e o presente. O objetivo principal no advento do descobrimento, que dá nome à emissão, foi uma forma de tirar o foco do regime político anterior. Já o Império aparece nos dois outros selos enquanto mero momento de transição para a República, não trazendo em sua arte nenhum símbolo imperial. Diferente dos dois selos relativos ao Império, o da República foi concebido para representar um de seus símbolos: Mariane, a personificação feminina republicana, a mãe-pátria.
As representações de eventos históricos em selos comemorativos se consagraram ao longo do tempo, sendo muito apreciadas até os dias de hoje. Mas, deve-se ter em mente que essa categoria de selos postais carrega, desde seu surgimento, uma característica peculiar: são seleções do que certos grupos da sociedade atual escolhem lembrar, reconstruções memorialísticas do passado, a partir do presente. A trajetória dos primeiros selos comemorativos, de 1900, nos ensina que os selos, tais como outros documentos históricos, não podem ser considerados um retrato fiel do passado. Daí a necessidade de estudá-los a partir das fontes que elucidem as questões históricas inerentes. (Fonte: Revista COFI – Correio Filatélico, edição 226, julho a setembro de 2012).
Um comentário:
Que legal!!há alguns anos a editora Abril lançou uma coleção de selos, toda semana nas bancas de jornais tinham um exemplar com a historia do selo de algum local e em cada publicação um catalogo para irmos colando os selos semanais, era muito legal.
Agradeço por me fazer lembrar desta fase da vida, em que ir na banca de jornal ainda era cultura, rss
Sua postagem esta perfeita, muito bem ilustrada e esrita também, fácil de ler, parabéns!
Deixo um abraço fraternal.
Nicinha
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