A viagem foi horrível. Duas horas sofrendo com enjôo, a bordo de uma “jardineira”. Apeei em algum ponto do centro de Rio Preto, que imagino ser na rua General Glicério. Mal podia andar de tanta fraqueza.
Minha mãe Maria agarrou forte a minha mão. Cruzamos as ruas correndo, ela me arrastando, com pavor da velocidade dos carros.
Eu caminhava olhando para o alto, admirando os prédios e tropeçando. Era tudo novidade, diferente da minha Ida Iolanda, com suas 30 casas, onde apenas a passagem interminável da boiada quebrava a rotina do lugar.
Foi meu primeiro contato com São José do Rio Preto, creio que em 1966, quando eu tinha de onze para doze anos.
Amor à primeira pisada. A imagem da cidade grande não me saiu mais da cabeça. Na adolescência, com amigos, pegava carona na rodovia Feliciano Salles Cunha pra vir a Rio Preto, nos sábados de manhã. O programa era passear pelo centro, cobiçando os discos de vinil e ouvindo música nas lojas.
Quando o comércio fechava, íamos a pé até a rodovia Washington Luis batalhar a carona de volta, pra chegar em casa na hora da janta, sem ter almoçado.
Aos 17 anos, outra mudança radical. Saí de manhã de Ida Iolanda num ônibus da Itamarati (os enjôos quase me mataram de novo) e aterrissei na Avenida Paulista para o vestibular de jornalismo da Cásper Líbero. O improvável aconteceu: passei e tive que partir.
Na metrópole banquei os estudos como camelô, vendedor de rua das Persianas Colúmbia. Irmãos e cunhados que lá moravam deram-me uma força. Repetia a mim mesmo uma promessa, diariamente: um dia vou viver em Rio Preto.
Em 1976, assim que fechei as notas na Faculdade, pedi as contas do emprego.
Cheguei a Rio Preto com uma carta de apresentação do Ibrahim Ramadan, dirigida ao Antonio Natalone. Fui ao “Diário da Região” e o Nata não estava. Resolvi caminhar pela cidade e vi nas bancas a primeira edição do jornal “Dia e Noite”. Peguei o endereço e fui a pé, do centro aos altos da Nossa Senhora da Paz, suando atrás de um emprego.
Tomei um chá de cadeira de duas horas esperando pelo editor José Hamilton Ribeiro. Quando ele saía para o almoço, enchi-me de coragem e pedi uma chance.
Zé Hamilton apanhou um exemplar do jornal, deu-me uma caneta vermelha e uma orientação:
- Entre ali na redação e veja se acha algum erro neste jornal...
Quando ele voltou, duas horas depois, o exemplar estava coberto de anotações vermelhas. E eu nem havia chegado à metade do calhamaço.
Zé fez cara de aprovação e deu a ordem:
- Pode começar agora. Entra ali, a revisão fica ao lado da oficina...
E assim comecei como revisor. Com o tempo trouxe vários colegas de Ida Iolanda e montamos uma república na rua Argentina – na época, um ermo! Por um tempo nos salvamos com a coxinha e o pingado (fiado) no Bar do San, ao lado do jornal. A pipoca completava o cardápio (...)
Rio Preto me encanta por ser metrópole regional, e, ao mesmo tempo, vila. Resistem pequenos núcleos que nos remetem às relações sociais dos lugarejos de nossas origens. Aqui, tenho grupos de amigos de profissão, amigos de bairro, amigos de botequim, amigos do estádio do Rio Preto. No Mercadão, muitos rostos conhecidos.
Devo o pouco que conquistei às oportunidades que esta cidade me deu. Generosa, aconchegante, como colo de mãe. Aqui criei os filhos: Carol, Liginha e Dodô, estudante e boleiro, e o neto Breno. Recebi nos últimos 35 anos propostas profissionais para deixar Rio Preto. Mas o colo da mãezona falou mais alto. Decidi ficar aqui, na segurança dos braços dela, apostando na qualidade de vida dos meus filhos.
Mario Soler e seu belo trechos de crônica que escreveu pro Diário da Região (acho que há dois anos) para comemorar o aniversário de Rio Preto e a homenagem à data de hoje.
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