quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014

2014. A mágica acabou, sobrou a violência


Quando Lula foi eleito presidente em 2002, a situação econômica, social e política do país era de enorme instabilidade. O MST promovia acampamentos em fazendas e beira de estrada por todo o país; quem não se lembra do clima pesado no Pontal do Paranapanema, em São Paulo. Nos grandes centros, o Movimento Sem Teto ocupava prédios abandonados; as centrais sindicais comandavam greves em quase todos os setores; a Polícia Civil e a policia militar se alternavam em suas próprias greves. Os professores da rede pública paulista faziam greve uma vez por ano. A UNE liderava marchas de estudantes em prol de quase todas as causas. O funcionalismo público vinha de pelo menos uma década de arrocho e desestruturação de carreira. 
O governo FHC (PSDB), em dois mandatos a frente do governo Federal, recorreu três vezes ao FMI por ajuda financeira. Sendo que o último acordo financeiro do governo brasileiro foi às vésperas das eleições gerais de 2002. Pra resumir, o clima no país era péssimo, as demandas sociais provenientes dos movimentos sociais organizados eram enormes, a mesmice política insuportável e, a crise econômica eminente. 
Lula publica a carta aos banqueiros, ops, Carta ao Povo Brasileiro, em que assina cartorialmente que não mudaria uma linha na condução da política econômica e, assegura que era o único capaz de baixar a pressão social e política das ruas, que, naqueles momentos finais do mandato de FHC, estava a um ponto da desordem generalizada. O PT havia mudado e, mudando, era a melhor garantia ao status quo de que, realmente era o único capaz de deixar tudo como estava - muito bom ao capital financeiro -, com o bônus social de que os protestos e a desordem em andamento seriam controlados.
Lula ganhou. Como num passe de mágica os protestos, manifestos, greves, marchas, palavras de ordem, demandas sociais e políticas urgentes foram arrefecendo, diminuindo e esfriando até o ponto que quase todos os movimentos sociais, com raras exceções, tinham seus representantes na máquina do Estado Federal. Lula entregara o que prometera. E entregando, jogou no ostracismo movimentos sociais inteiros com décadas de lutas e experiências acumuladas.
Para entender os manifestos sociais das ruas em 2013, deve-se entender que, na verdade, o que emerge não é novo, mas aquilo tudo que numa jogada política – acolher na máquina do Estado os movimentos sociais – ressurge agora com mais força, mais energia, mais pressão. Com a diferença de que se onze anos antes eram os movimentos sociais organizados que encaminhavam e lideravam os protestos e marchas, agora, tais manifestos era resultado, num primeiro momento do MPL (Movimento Passe Livre), inexistentes em 2002, mas num segundo momento expressão das forças sociais espontâneas (afinal, os movimentos sociais organizados cooptados pelo Estado, estavam inertes) e, profundamente descontentes com a situação geral da vida, especialmente nos grandes centros urbanos.
Ainda que uma grande parcela da sociedade brasileira tenha recebido atenção significativa das políticas sociais do governo Federal petista, o fato é que, 2013 revelava que o sucesso de Lula - em anestesiar os movimentos sociais e embernar as demandas sociais urgentes - havia chegado ao fim. Os manifestos de Junho de 2013 trouxeram as mesmas demandas presentes nas greves, marchas e protestos do fim do governo FHC. Isto é, a realidade não havia mudado, pelo menos na imensa dimensão das necessidades urgentes da sociedade.
Vide o MST em Brasília esta semana (Fevereiro de 2014) num grande protesto contra o governo Dilma.
Somam-se às necessidades urgentes do povo, especialmente nos grandes centros urbanos, a sensação, entre largas parcelas da classe média brasileira, de descontrole social, caos e, a certeza de que as mudanças estruturais necessárias ao avanço sustentável do país, não ocorrem. 
A paralisia do congresso nacional em promover as reformas necessárias, política, partidária, administrativa, burocrática, da mídia, tributária, educacional, conjugado com uma mídia vociferante que mais amplia a sensação de desordem e violência do que realmente esclarece e educa, resulta numa forte sensação de que nada é possível nessa desordem de coisas.
Onde a classe política e o Estado não são capazes de demonstrarem, com clareza, sua capacidade de dar curso e, encaminhar, as demandas da sociedade que representam, o resultado é a explosão de violência em todos os setores da sociedade; que é o que estamos vendo há muito tempo nas favelas e periferias e, agora nas praças, centros e lugares importantes e valorizados da cidade.
O que está em questão é o Brasil de sempre, injusto, desigual, desequilibrado e violento. Tentar desqualificar os protestos, arruaças e, as muitas violências praticadas no varejo e no atacado sejam pelo Estado ou, por marginais pobres ou, não, recorrendo a um discurso classista é não reconhecer o quadro social anômico em que estamos. 
Tudo o que está nas ruas desde 2013, é a expressão maior de um país que exige muito mais do que o que feito até agora. Nesse sentido, me parece que PT e PSDB muito pouco tem a apresentar. 
Luciano Alvarenga

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