O dia em que o
meritíssimo prendeu o Zé
Mário Soler
O ambiente do Judiciário me parece opressor. Deve ser coisa do DNA caipira. Caras sisudas, homens de paletó pra lá e pra cá, funcionários com pastas de processos, pessoas na sala de espera com pressa de ganhar a rua.
Creio que o Judiciário, concebido para proteção, reparação e justiça, ainda é, dos três poderes, o mais incompreendido pelo povo simples. Legislativo e Executivo, mais próximos, são os mais cobrados.
Nas décadas de 80 e 90, a cobertura dos atos do Judiciário na imprensa local limitava-se ao júri popular, e, ainda assim, aos casos mais rumorosos, nos quais o amigo Paulo Nimer, notável tribuno, tinha papel relevante.
O tempo passou e algumas coisas mudaram. A TV Justiça nunca amealhou tanta audiência quanto no período do mensalão. O ministro Joaquim Barbosa, herói-celebridade, foi aplaudido nas redes sociais, em aeroportos, campeão de selfies, justiceiro.
A sombra larga desse personagem atiçou juízes de primeira instância, que conquistaram preciosos minutinhos no Jornal Nacional, por exemplo, tirando o WhatsApp do ar.
Divago sobre este tema árido pra recordar um episódio das antigas, envolvendo o jornalista multimídia José Maria de Arruda, que infelizmente nos deixou no início deste mês de maio de 2016.
Zé tinha na fotografia sua grande paixão. Mas foi também designer gráfico, repórter, diagramador. Apaixonado pelo ofício, dominava as técnicas de imprensa, da redação à impressão. Terminou seus dias como dono de gráfica, ao lado da esposa Sandra.
No começo dos anos 80, eu e o Zé Maria fomos até o Palácio da Justiça, onde trabalhadores de uma empresa falida recebiam indenização trabalhista num posto bancário, no térreo do edifício, após o leilão de imóveis da empresa. Enxergamos uma boa pauta para o Diário da Região.
O Zé entrou no Fórum disparando fotos pra todo lado. Eu entrevistei várias pessoas. Quando nos preparávamos pra sair, surgiu um segurança e nos intimou a entrar no elevador. Fomos desembarcados na sala do chefe do Fórum.
- Com ordem de quem vocês entram numa repartição pública batendo fotos? – bradou, com ar superior, acomodado numa confortável poltrona.
Zé, um cara do bem, perdeu a pose. A memória desbotada me permite imaginar que tenha sido mais ou menos assim o diálogo seguinte:
- Repartição pública é do povo... Você não pode proibir !
- Você...? - estranhou o diretor, informando que estávamos detidos até segunda ordem.
Pra piorar, o segurança queria tomar o filme fotográfico. Aí o Zé queimou o pé de vez.
- Meu filme? Nem pensar!
Personagem secundário na cena, tentei minimizar o incidente. O diretor saiu enfurecido, nos deixou na sala de castigo por alguns minutos e não voltou mais.
O auxiliar recebeu ordem pra nos libertar, com cara de quem, no fundo, no fundo, queria dar uns sopapos nos jovens repórteres inconvenientes.
O Zé voltou à redação triunfante, mas a matéria saiu sem as fotos no dia seguinte por falta de espaço.
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