domingo, 17 de janeiro de 2016

Mário Soler e seu O OFÍCIO DE ESCREVER...


Minha coluna no "Diário da Região".

O OFÍCIO DE ESCREVER...

Mário Soler

Alguém vaidoso usaria no título acima a palavra “arte”. Prefiro definir a escrita como ofício, atividade de trabalho que requer uma técnica específica. Arte é para poucos.
Comecei nesse oficio como revisor no extinto jornal “Dia e Noite”. Tempos antigos, em que o repórter e o redator fechavam o texto e submetiam ao editor. Daí, o texto seguia para a digitação e finalmente chegava às mãos do revisor.
O esquema funcionava bem na maioria das vezes, mas sempre podia dar algum bode, porque eram muitas mãos envolvidas na tarefa.
Articulista dos bons, o polido doutor Valdemiro Naffah perdia a calma quando grafavam seu nome com "o" no lugar do "e". E é preciso reconhecer que isso acontecia com uma certa frequência.
O precioso texto da jornalista e escritora Dinorath do Valle exigia olhar atento. Uma vírgula errada e lá vinha uma bronca fenomenal.
Certa vez, eu e um amigo revisor decidimos, por conta e risco, corrigir um título que nos pareceu errado. Deu a maior zebra. O álbum de Milton Nascimento, batizado “Geraes”, virou “Gerais” na manchete principal da página de cultura e lazer, para atiçar a ira da Dinorath naquele finalzinho de 1976.
Com o passar do tempo ganhei uma chance na redação do jornal, mas havia um problema: eu não sabia datilografar. Na Faculdade Cásper Líbero não havia aulas práticas pra turma do jornalismo noturno.
O editor me viu catando milho na velha máquina de escrever e deu um ultimato: ou você aprende a digitar, ou volta pra revisão.
Passei a chegar mais cedo ao jornal pra treinar. A muito custo desenvolvi uma técnica improvisada, usando apenas os dois indicadores, até hoje ligeiramente tortos pelas quatro décadas de lida.
Quando me viu escrevendo de modo tosco, minha sogra, Dona Mariquinha (de saudosa memória), perguntou, com justificada razão:
- Você tem certeza que vai sustentar a minha filha com esses dois dedos?
O improviso acabou dando certo e até hoje ganho os meus trocados assim, com os dois indicadores, espancando os modernos e sensíveis teclados do computador.
Os tempos românticos ficaram no passado. A profissão mudou rapidamente e a cada dia surgem novidades no jeito de fazer jornalismo e na utilização das chamadas plataformas.
O jornalista dito moderno tem de ser multiuso. Ele mesmo cavuca a pauta, levanta os dados, escreve e edita a matéria, posta nas redes sociais, responde aos leitores. Esse faz-tudo é uma operação de risco. Acho difícil caçar erros em nosso próprio texto.
Uma distração e lá se vai uma concordância que discorda, um ‘s’ no lugar do ‘z’, um hífen mal colocado (com a reforma ortográfica o uso dele ficou ainda mais confuso pra mim), um ‘mau’ no lugar de ‘mal’, coisas que trarão dissabores no dia seguinte quando o texto chegar ao público e o chefe te chamar na salinha pra conversar.
São ossos desse ofício fascinante. Mas nada que se compare à recente gafe de um jornalão, que foi obrigado a produzir uma correção muito divertida. 
Erramos: Nasa quer levar batatas,
 e não baratas, para Marte".
Os marcianos, aliviados, agradecem.

Nenhum comentário: