Minha crônica quinzenal no "Diário da Região".
O SUCESSO DO BOKO-MOKO
Mário Soler
Antes de mais nada, deixem que eu apresente aos mais jovens o “boko-moko”. Nos anos 70, um comercial de guaraná, criado pelo publicitário Sérgio (Arapuan) Andrade, fez um sucesso incrível na televisão.
O ator Roberto Marquis, se não me falha a memória, estrelava a peça publicitária. Ao se deparar com alguém cafona, brega, demodê, ele apontava o dedo e bradava a estranha expressão inventada por Arapuan: “boko-moko”!
Tudo, claro, pra reforçar o contraste: beber o guaraná era decisão de bom gosto, da moda. Boko moko era o avesso.
O guaraná vendeu queném água, o publicitário emplacou mais uma de suas inteligentes criações e o ator foi parar na “Praça é Nossa”, do SBT. Quem não conhece o comercial, e ficou curioso, corra ao dr google e digite “boko moko”. Há vários vídeos por lá.
A recordação me vem à cabeça ao observar o jeitão do sr Adenor, o Tite, o treinador vitorioso do Corinthians. O modo de se vestir, o vocabulário, o gestual durante os jogos, aquele topetão... é boko-moko sem tirar, nem por.
Sei que dez entre dez cronistas esportivos amam o bonzinho Tite, o contraponto dos temperamentais Muricy, Luxemburgo e Leão.
O treinador gaúcho, de fato, é quase um monge. Pede licença para discordar, chora quando o marketing recomenda, veste-se com as cores do time que dirige. Joga o jogo, é boa gente.
O mais curioso é seu modo de falar, empolado, engolindo verbos de ligação e se escorando nas palavras-chaves. Jornalistas mais fiéis à transcrição de suas falas precisam inundar as frases do treinador com parêntesis explicativos.
Algumas frases profundas que o professor repetiu nas coletivas:
- Vamos jogar por uma bola!
Pelo que sei, sempre tem só uma em jogo pra 22 marmanjos.
- Vamos propor o jogo... Sim, devemos propor o jogo!!
Propor como? Requerimento em duas vias com firma reconhecida?
- Precisamos estar focados... é um jogo de seis pontos!
Salvo engano, cada vitória continua valendo três pontos, o empate um e a derrota nenhum.
E quando todo o time está ali, a um passo do gramado, ele pede um minuto e filosofa:
- A bola fala e o campo fala. É lá dentro que se fala, que se consegue a vaga. É no campo que se mostra.
Profundo e motivador, se compreendido, evidente.
Como aquele jeito de molenga, Tite jura ser “pilhado”:
- Atrás desse cara ponderado, tem um cara intenso no que faz, apaixonado até demais.
Imagino o bravo comandante, à saída do túnel, tentando motivar seus pupilos:
- A primeira e melhor vitória é conquistar a si mesmo...
Parece que vejo o treinador reprimindo o menino Malcom, acusado de tentar comprar uma carteira de motorista:
- Tu deves saber que é eticamente inconcebível adquirir por meios escusos o direito, que por meios éticos seria legítimo, de pilotar um veículo automotor.
E o menino, boquiaberto:
- Claro chefe, claro!
Acredito que o segredo do sucesso de Tite está no trabalho e na confiança que transmite aos seus boleiros, ainda que tente usar a norma culta pra se comunicar com essa turma que prefere a língua do “agora é tóis”.
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